terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Amor em Conflito- Norman Geisler & Josh McDowell

Deus é amor, e o amor VEM de Deus. Portanto, em Deus, não há conflito de amor. Existe uma perfeita harmonia entre Deus Pai – o grande Agente do Amor – Seu Filho amado e o Espírito de Amor. Mas na Terra a história é diferente. Os vários deveres do amor algumas vezes entram em conflito uns com os outros até para os que estão mais decididos a amar como Cristo amou. As responsabilidades do amor se sobrepõem e os deveres se chocam, provocando tensão. Outras vezes dois ou mais mandamentos são conflitantes. Como decidir entre eles? Em outras ocasiões, nenhuma das opções abertas para nós parece a coisa amorosa a fazer. Onde buscar as respostas? Esses dilemas põem à prova nosso compromisso de amar.
O povo de Deus na Bíblia enfrentou freqüentemente dilemas éticos, nos quais a escolha amorosa era de difícil discernimento. Por exemplo:

§ Para o patriarca Abraão matar seu filho é errado, assim como desobedecer a Deus. Como decidir o que fazer quando Deus lhe dá ordem para oferecer Isaque como sacrifício humano? (Veja Gênesis 22.)

§ Deus ordena obediência ao Faraó do Egito, mas este manda que as crianças inocentes dos israelitas sejam mortas. Como as parteiras decidiram o que fazer? (Veja Êxodo 1.)

§ A Bíblia proíbe a mentira, mas os espiões de Israel serão mortos se Raabe revelar o esconderijo deles para os soldados que estão investigando. O que ela deve fazer? (Veja Josué 2.)

§ A rainha dá ordens para que todos os profetas de Deus sejam mortos. Mas Obadias desobedece e esconde cem deles. Obadias está agindo com amor? (Veja 1 Reis 18.)

§ Abraão teme pela segurança da sua esposa e diz que ela é sua irmã ao rei. A mentira de Abraão é uma atitude de amor? (Veja Gênesis 20.)

§ O homicídio é proibido por Deus. Mas o rei Saul está mortalmente ferido e ordena que seu escudeiro o livre do sofrimento. O servo estava certo em matar o seu rei? (veja 1 Samuel 31.)

Estas situações podem parecer remotas e distantes das experiências contemporâneas. Afinal de contas, sacrifícios, monarcas em guerra e costumes bastante primitivos não fazem parte da nossa cultura. Mas nós também temos a nossa cota de conflitos de amor que não são menos ambíguos e desafiadores. Por exemplo, como você agiria com amor quando:

· os mandamentos dizem que não devemos matar, mas o governo do seu país o manda ao campo de batalha pala defender a democracia?
· como adolescente cristão, seus pais o proíbem de servir a Deus ou de falar com outros cristãos?
· sua mulher sofre complicações graves no parto e está quase morrendo, você tem de escolher entre salvar a vida dela ou a de seu filho?
· uma colega de trabalho o faz jurar segredo e depois confessa que está roubando dinheiro da empresa?
· seu avô de noventa anos, sofrendo de dor contínua e torturante por causa de uma doença terminal, pede que você lhe dê comprimidos suficientes para levá-lo "aos braços de Jesus e à paz eterna"?
· um indivíduo enlouquecido pelas drogas entra no restaurante onde você se encontra com seus pais, mulher e filhos e começa a atirar selvagemente, e você pode matá-lo ou atirar-se na linha de fogo para salvar outros?
Estes exemplos tocam apenas superficialmente em uma enormidade de dilemas éticos que testam a nossa compreensão e compromisso no que diz respeito ao amor. Em muitas situações desse tipo, a escolha mais amorosa nem sempre é óbvia. Como decidir o que fazer?

BECOS SEM SAÍDA PARA RESOLVER OS CONFLITOS NO AMOR

Alguns crentes sugeriram maneiras diferentes para resolver a questão do amor em conflito. As seguintes respostas talvez pareçam oferecer um caminho claro para uma solução bíblica, mas acabam sendo becos sem saída no esforço de praticar o amor na vida real.
Só existe um dever absoluto de amam portanto não há conflito. Esta linha de pensamento declara que são necessários dois absolutos para que haja um conflito absoluto. Mas, desde que há um único dever absoluto no amor, então todos os conflitos são aparentes e não reais. Em todas as situações só existe um dever absoluto: Tome a atitude mais amorosa possível.
Esta é uma abordagem simples e direta, livre do peso de vários mandamentos éticos que em geral parecem estar em conflito entre si. Ela também preserva a natureza absoluta do amor e instrui o crente a simplesmente dar a resposta mais piedosa e amorosa. Ela é também de ampla aplicação. A regra geral é amar, mas o significado particular do amor será determinado pela situação específica.
Esta abordagem, porém, não resolve os dilemas éticos. Primeiro, não existe apenas um dever absoluto de amar, mas pelo menos dois: amar a Deus e amar ao próximo. Como Abraão descobriu, ao ver-se preso entre Deus e seu filho Isaque, esses dois deveres algumas vezes entram em conflito. Não é possível dizer que amar a Deus é um absoluto e amar as pessoas não é. Ambos são ordenados por Deus.
Além disso, a ética de um só absoluto é demasiado geral para ser significativa. Dizer-nos para fazer a coisa mais amorosa possível sem explicar como podemos determiná-la deixa-nos num dilema. Sem os mandamentos e o exemplo de Cristo, os cristãos não saberiam quais são realmente as obrigações absolutas do amor, para não dizer nada da habilidade para cumpri-las. Ficamos à mercê de nossas intuições e conjeturas.
Outra linha de pensamento sem saída declara: Os conflitos morais são falsos dilemas porque Deus sempre provê uma saída, uma terceira opção. Os cristãos que aceitam isto asseveram que Deus é fiel em relação aos que são fiéis à Sua lei e num conflito (tentação) aparente sempre "vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar"(1 Cor. 10:13). Deus interferiu e salvou Abraão da necessidade de matar Isaque e Ele fará o mesmo por qualquer outro que seja fiel aos Seus mandamentos.
Essas pessoas citam incidentes como o que ocorreu na Segunda Guerra Mundial para provar que Deus oferece uma saída para os dilemas morais quando os indivíduos se comprometem a obedecer aos Seus mandamentos. Soldados alemães invadiram uma casa de simpatizantes da causa judia, onde os judeus eram escondidos debaixo do assoalho. "Vocês estão escondendo judeus aqui?", perguntaram os soldados. Uma criança que fora ensinada a nunca mentir deixou escapai: "Sim, senhor, eles estão debaixo da mesa". Em vez de procurar um alçapão, os soldados riram dizendo: "Isso é ridículo. Não há ninguém em baixo da mesa". Eles foram embora, poupando milagrosamente os judeus, apesar do esconderijo deles ter sido revelado. "Deus proveu uma saída para as judeus e seus hospedeiros quando a verdade foi revelada", dizem alguns, "e Ele fará o mesmo por nós".
Esta opinião é louvável á primeira vista, pois confirma a existência de muitos mandamentos absolutos de amor na Escritura e não só uma norma virtualmente sem sentido e irrelevante. A suposição é esta: se Deus emitiu ambos os mandamentos supostamente conflitantes, Ele espera que obedeçamos aos dois e nos ajudará a cumpri-los sem pecar.
Será que todos os conflitos são apenas aparentes e não reais? Haverá sempre uma terceira opção em cada dilema? A evidência é contrária. Abraão não teve de matar o filho, mas ele pretendia fazer isso e Jesus ensinou que a moral é uma questão de intenção (Mat. 5:21,22,27,28). As parteiras hebréias salvaram a vida das crianças, mas tiveram de desobedecer ao governo para isso. Os pais de Moisés esconderam o filho pequeno em vez de entregá-lo ao carrasco do Faraó como ordenado. Eles não foram repreendidos por Deus pela desobediência que assumiram, mas elogiados pela fé que tiveram (Heb. 11:23).
Este ponto de vista supõe também que todos os mandamentos sejam equivalentes. Mas não são. O amor a Deus é o "grande e primeiro mandamento" (Mat. 22:38). O segundo mandamento, amor pelo próximo, é semelhante ao primeiro, mas não equivalente a ele (v. 39). Há ocasiões em que o amor a Deus entra em conflito com o amor pelas pessoas e, nesses casos, o amor por Deus deve vir em primeiro lugar. Se e quando Deus provê milagrosamente um meio de acomodar ambos, devemos ser gratos. Mas a história revela que Deus nem sempre responde desta forma. O povo de Deus teve de escolher muitas vezes entre obedecer a Ele ou às pessoas – e Deus honrou essas escolhas.
Outra maneira errada de pensar declara: Quando não podemos evitar a quebra de um mandamento para obedecer a outro, devemos simplesmente escolher o menor dos dois males. Este ponto de vista impele-nos a escolher sempre a opção menos desamorosa possível em face de um conflito moral. É claro que, se quebrarmos um mandamento de Deus em qualquer circunstância, estamos pecando. A providência de Deus nem sempre nos oferece um meio de fugir do pecado; mas damos graças porque o amor de Deus provê perdão para os que confessam. Os apóstolos então, evidentemente, terão de confessar seu pecado de desobediência ás autoridades judias, a fim de obedecer ao mandamento de Deus para pregar. O jovem que precisa escolher entre obedecer a Deus ou aos pais deve obedecer a Deus e, ao mesmo tempo, pedir e receber o perdão de Deus por violar o quinto mandamento.
Esta abordagem contém alguns pontos que precisam ser analisados com mais cuidado. Primeiro, um Deus onisciente e cheio de amor julgaria alguém culpado por fazer o que era inevitável? Se a nossa escolha for o menor entre dois males, será justo que Deus nos culpe por fazer o melhor que pudermos? Dificilmente. Parece incoerente, de acordo com a natureza de Deus como revelada na Escritura, estabelecer mandamentos absolutos mas conflitantes e depois nos declarar culpados por escolher um deles, mesmo que seja a melhor escolha. A pessoa só é culpada se a sua atitude for evitável.
Segundo, se até mesmo a escolha num conflito moral for pecado, o que isso diz sobre a impecabilidade de Cristo? Por exemplo, Jesus confirmou o mandamento para honrar pai e mãe (Mat. 15:4; 19:19). Mas, em pelo menos uma ocasião, Ele deixou Sua mãe esperando para vê-Lo por estar ocupado servindo outras pessoas (Mat. 12:46-49). A fim de obedecer ao Pai e oferecer Sua vida como sacrifício pelo pecado, Jesus teve de deixar a mãe aos cuidados de outros (Jó 19:25-27). Em situações desse tipo e talvez em muitas outras, Jesus desobedeceu ao menor dentre dois ou mais mandamentos conflitantes. Ao fazer isso, Ele então pecou – o que as Escrituras rejeitam absolutamente (Heb. 4:15), ou não existem situações que exijam um mal menor. Há sempre um bem positivo possível em cada escolha moral, e escolher o bem maior transcende qualquer obrigação de fazer o bem menor.
Terceiro, desde que Deus nos chama para a obediência e santidade, por que Ele nos colocaria numa situação em que todas as escolhas são erradas? Não faz sentido dizer que somos moralmente obrigados a fazer o mal menor. Isto significaria que é certo agir errado, é certo pecar, e isso não é bíblico.

OPTE SEMPRE PELO BEM MAIOR

O amor nunca fica preso a um dilema. Há níveis e esferas de amor, e um é sempre superior ao outro. Cada mandamento de amor é absoluto em sua área. Mas, quando essa área se sobrepõe à outra, então a menor responsabilidade de amar deve ficar subordinada à maior. Por exemplo, quando as duas estão em conflito, o dever para com Deus tem prioridade sobre o dever para com as pessoas, como demonstrado no exemplo de Abraão e seu filho Isaque. As parteiras hebréias obedeceram à obrigação maior de salvar vidas humanas, sobrepondo-a à de contar a verdade ao rei que procurava matar as crianças.
Cada um dos mandamentos absolutos da Bíblia é obrigatório para a relação que especifica. O adultério é sempre errado. O assassinato nunca é certo por si mesmo. A mentira é universalmente errada como tal. Todavia, quando uma ou mais dessas relações, que são erradas em si mesmas, se sobrepõem a outra, nosso dever com a menor pode ser suspenso em vista de nossa responsabilidade com a maior. Por exemplo, se você acorda e encontra um ladrão armado com uma faca em seu quarto, a proibição de matar é suspensa em favor da obrigação de proteger sua mulher e seus filhos. Não existe exceção para os mandamentos absolutos, mas existem algumas isenções em vista das prioridades superiores do amor. Há sempre um bem maior.
Além disso, como Deus nos deu muitas leis definindo a natureza e as áreas do amor, podemos saber antecipadamente o que fazer numa dada situação. Isto coloca a ética do amor para o cristão em oposição direta à ética situacionista. A ética situacionista afirma que a situação determina a atitude amorosa a tomar. A ética do amor de Deus prescreve antecipadamente o que deve ser feito em cada situação, mesmo quando os mandamentos estejam em conflito. Devemos sempre optar pelo bem maior.
O fato de haver bens maiores e menores está claro na Escritura. Jesus falou dos "preceitos mais importantes da lei" (Mat. 23:23). A justiça e a misericórdia pesam mais na balança de Deus do que a contribuição, embora a lei exigisse ambas as coisas (Mat. 23:23). Ajudar alguém necessitado, tal como a tarefa de alimentar os famintos ou curar os doentes, era mais importante para Jesus do que guardar o sábado (Mat. 12:1-5).
Os dois grandes mandamentos de Jesus revelam bens maiores e menores. O amor a Deus é um bem maior do que o amor pelas pessoas (Mat. 10:37). O seu amor por Deus pode levá-lo a desobedecer ao governo se este ordenar que você cometa pecado, mas o amor pelo seu país nunca deve levá-lo a desobedecer a Deus em nenhuma circunstância. O amor pela família é um bem maior do que o amor pelos estrangeiros (1 Tim. 5:8). Ajudar os crentes é um bem maior do que prover para os incrédulos (Gál. 6:10). No próximo capítulo, vamos discutir uma lista mais detalhada dos bens maiores e menores sugeridos na Escritura.
Todo o conceito de recompensas está alicerçado na premissa de que algumas atividades são melhores do que outras. Na parábola de Jesus sobre os dez servos, o que foi mais bem-sucedido ficou encarregado de dez cidades; o que não se saiu tão bem recebeu cinco cidades (Luc. 19:12-26). Paulo escreveu aos fiéis: "Porque importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo" (2 Cor. 5:10). Alguns vão receber uma coroa, e outros não (Apoc. 3:11). As obras de alguns provarão ser "ouro, prata, pedras preciosas", enquanto as de outros se assemelharão a "madeira, feno, palha" (1 Cor. 3:12). A cada dia temos oportunidades para escolher bens maiores ou menores pelos quais vamos receber recompensas maiores ou menores.
Assim como há bens maiores e menores, há também males maiores e menores. Todos os pecados são pecado, mas nem todos os pecados são igualmente pecaminosos. Tiago escreveu: "Qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos" (Tia. 2:10). Ele estava falando da unidade da lei e não da igualdade do pecado. Tiago reconheceu bens maiores e menores quando sugeriu que os professores da Palavra são mais responsáveis do que os que não são professores (Tia. 3:1). Jesus indicou que ter pensamentos adúlteros é tão errado quanto cometer um ato de adultério. Mas o ato é um mal maior do que o pensamento porque causará mais impacto sobre mais pessoas do que o pensamento.
Há, portanto, uma escala que mede o bem e o mal. Alguns atos são melhores e outros piores. De fato, Jesus falou de um "maior pecado" (João 19:11). O bem e o mal estão classificados numa pirâmide, com o melhor no alto, o pior em baixo, e graus variados de bem e mal no meio. Alguns atos imorais são mais viciosos do que inúmeros outros atos perversos. Por exemplo, um ato brutal de homicídio pode ser pior do que muitas mentirinhas. Portanto, sempre que enfrentamos um conflito entre boas alternativas ou entre o bem e o mal, o curso de ação moralmente certo é sempre o bem maior ou a resposta mais amorosa. De fato, optar por algo menor que o bem maior pode ser errado. Por exemplo, se um homem salvasse duas pessoas de morrerem afogadas, mas pudesse ter salvado cinco com a mesma facilidade, o bem praticado por ele teria sido manchado pelo pecado. Tiago declarou: "Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz, nisso está pecando" (Tia. 4:17).
Uma vez que os atos morais têm valores diferentes, é necessário que os cristãos pesem as alternativas para o amor, a fim de escolher o bem maior ou a resposta mais amorosa. Esta é em geral uma tarefa difícil, mas não impossível quando conhecemos a escala divina de valores da Escritura.
A base para determinar bens maiores ou menores é o maior de todos os bens: Deus. Desde que não podemos perguntar diretamente a Deus, temos de encontrar a bondade absoluta na Sua lei e no Seu Filho, que nos são apresentados na Bíblia. A Palavra de Deus é o critério para medir bens maiores e menores. O valor de um ato é então determinado por quão semelhante a Cristo e a Deus ele é. As prioridades éticas são determinadas por quão próximas ou quão distantes elas estão do amor absoluto encontrado na lei de Deus e na vida de Cristo. Quanto mais semelhante a Cristo é o ato, tanto maior o bem; quanto mais próxima a semelhança do amor perfeito de Deus, tanto mais amorosa ela é.
Esses conceitos destacam uma importante diferença entre a ética absoluta do amor e muitas outras éticas contemporâneas. A ética cristã é determinada pelas regras reveladas e não pelos resultados esperados. Em muitos círculos, é comum determinar o que está eticamente certo, avaliando o que trará o bem maior para o maior número de pessoas a longo prazo. Essa teoria, chamada utilitarismo, foi iniciada pelo filósofo Jeremy Bentham e desenvolvida por John Stuart Mill em princípios do século dezenove. Ela parece boa, mas as diferenças entre a abordagem utilitária e a cristã para determinar o bem são cruciais.
Primeiro, os utilitaristas enfocam os resultados desejados e planejam reagir em conformidade a estes. Os cristãos enfocam a resposta mais amorosa, como revelada nas regras e nos princípios da Escritura, deixando os resultados a longo prazo nas mãos de Deus. Nós não determinamos a regra pelos resultados; os melhores resultados possíveis ocorrerão, entretanto, quando obedecermos à regra já estabelecida por Deus.
Segundo, as regras de Deus para determinar o bem supremo são absolutas; as regras utilitaristas são generalizações baseadas em experiências anteriores que alcançaram os melhores resultados. os princípios da ética cristã são alicerçados na natureza e na vontade de Deus, sendo então universalmente aplicáveis e absolutamente obrigatórios. As regras utilitaristas estão sujeitas a exceções não especificadas que justificarão os resultados.
Terceiro, para os utilitaristas, um ato é bom somente se tiver boas conseqüências. Para os cristãos, um ato só é bom se cumprir os mandamentos de Deus separadamente das conseqüências. Por exemplo, se um indivíduo falhar nas suas melhores tentativas de salvar alguém que se está afogando, os utilitaristas diriam que não foi um ato bom, porque falhou. Para os cristãos, a tentativa amorosa é boa resulte ou não em salvamento.
Os cristãos gozam de várias vantagens sobre os utilitaristas. Não determinamos o que é certo ou errado; Deus já tomou a decisão e revelou-a na Sua Palavra. Nós só decidimos que pensamento ou ação estará de acordo com o que Ele revelou ser correto. Além do mais, não temos de descobrir qual a coisa amorosa a fazer numa situação de conflito. Deus já revelou as Suas prioridades amorosas na Escritura. Finalmente, não temos de adivinhar os resultados a longo prazo baseados na experiência humana, a fim de determinar o melhor curso de ação. Nós simplesmente agimos de acordo com a revelação de Deus e permitimos que Ele cuide dos resultados a longo prazo.

FAZENDO A NOSSA PARTE

A ética do amor cristão não é um programa de computador que emite respostas para conflitos de amor sem requerer nenhum esforço ou decisão da nossa parte. Pelo contrário, são necessários muita dedicação e esforço para escolher sempre o melhor bem e a resposta mais amorosa. Devemos encher a mente e o coração com as Escrituras, a fim de conhecer a natureza e o amor de Deus, Suas leis e a vida exemplar do Seu Filho. Jesus acusou os religiosos da Sua época: "Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus" (Mat. 22:29). Quanto mais você assimila a Palavra de Deus, tanto mais preparado estará para discernir as escolhas certas nas situações de conflito.
Devemos também pesar as alternativas, em espírito de oração, para descobrir o curso de ação que esteja mais de acordo com os mandamentos bíblicos. Esta não é uma tarefa que você pode delegar aos seus pais, líder de estudo bíblico ou pastor. A decisão é sua, e você deve então considerar as opções e pedir orientação a Deus nas Escrituras e mediante oração pessoal. A seguir, você deve colocar em prática a sua decisão. Apenas saber o que é certo não basta; é preciso tomar as providências necessárias para transformar a ética em ação.
Qual o papel do Espírito Santo nesse processo? É o Espírito Santo quem nos revela a verdade e nos capacita a praticá-la (João 16:13). Sem os princípios revelados pelo Espírito para agirmos e sem o poder dEle para praticarmos o que é certo, não pode haver ética cristã. Sabemos que o Espírito de Deus não irá guiar-nos separadamente da Palavra de Deus ou em conflito com os preceitos nela incluídos. A verdade que Deus revela pelo Seu Espírito é a contida nas Escrituras. A Bíblia é suficiente pala a fé e para a prática; ela é a revelação completa do amor absoluto de Deus (2 Tim. 3:16-17). Não enfrentamos situações morais para as quais não encontramos princípios na Palavra de Deus. O papel do Espírito Santo é iluminar a verdade de Deus para nós, a fim de podermos tomar as decisões certas. Ele faz isso lembrando-nos de um princípio bíblico que talvez tenhamos esquecido, dirigindo-nos a um principio que ainda não tenhamos descoberto, ou dando-nos novo discernimento em relação a princípios que já estejamos usando.
Em todos esses casos, porém, o Espírito Santo nos conduz à Bíblia para que obtenhamos a resposta. Em caso algum devemos ir além ou desviar-nos do que está escrito na Palavra de Deus. Essa é a maneira de Ele ajudar-nos a discernir a praticar o maior e mais amoroso bem até mesmo nas situações mais difíceis.

PERGUNTAS DIFÍCEIS E RESPOSTAS DIRETAS SOBRE O CONFLITO NO AMOR

E o poder milagroso de Deus? Não podemos esperar que Ele interfira nas situações em que a amor entre em conflito?
Deus é Todo-Poderoso e cheio de amor, mas Ele não é o nosso gênio da garrafa, esperando para livrar-nos de todo problema ou dilema moral. A presença constante de Deus nos é prometida (Mat. 28:20), mas em ponto algum da Escritura temos a promessa de que Ele irá sempre intervir e salvar-nos dos conflitos morais. Sadraque, Mesaque e Abede-Nego compreenderam isso, dizendo ao rei Nabucodonosor: "Se o nosso Deus, a quem servimos, quer livrar-nos, ele nos livrará da fornalha de fogo ardente, e das tuas mãos, ó rei. Se não, fica sabendo, ó rei, que não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a imagem de ouro que levantaste" (Dan. 3:17-18; ênfase acrescentada).
Esperar um milagre em cada situação difícil transfere para Deus a responsabilidade de nossas escolhas e atos, algo que Ele não planejou. Trata-se de uma mentalidade que sugere: "Sempre que estiver em perigo, aposte em Deus". Temos a Sua Palavra para nos dirigir e o Seu Espírito para nos encorajar e consolar. Estes são milagres em si mesmos e estão sempre ao nosso dispor. Nunca devemos basear uma decisão presente sobre a possibilidade de Deus operar um milagre espetacular no futuro. Isso eqüivale a tentar a Deus, algo que jamais devemos fazer (Mat. 4:7). Pelo contrário, devemos usar os recursos que Ele já nos deu e confiar na Sua presença enquanto avançamos em meio às dificuldades e aos dilemas da vida.

O propósito eterno- W. Nee

Já falamos da necessidade da revelação, da fé e da consagração para vivermos a vida cristã normal, mas nunca entenderemos claramente por que são necessárias, se não tivermos em mente o alvo que Deus tem em vista. Qual é o grande alvo divino, o propósito de Deus na criação e na redenção? Pode se resumir em duas frases, uma de cada seção de Romanos já mencionada. É: "a glória de Deus" (Rm 3.23), e "a glória dos filhos de Deus" (Rm 8.21).
Em Rm 3.23, lemos: "Todos pecaram e carecem da t glória de Deus". O propósito de Deus para o homem era a glória, mas o pecado frustrou esse propósito, fazendo com que o homem se desviasse deste alvo da glória de Deus. Quando pensamos no pecado, instintivamente pensamos no julgamento que ele acarreta; invariavelmen­te associamo-lo com a condenação e o Inferno. O pensamento do homem é sempre a respeito da punição que lhe sobrevirá se pecar, mas o pensamento de Deus gira em torno da glória que o homem perde se pecar. O resultado do pecado é que perdemos o direito à glória de Deus; o resultado da redenção é que somos qualificados de novo para a glória. O propósito de Deus na redenção e é glória, glória, glória.

Primogênito entre muitos irmãos

Esta consideração nos leva adiante, para o capítulo 8 de Romanos, onde o tema se desenvolve nos vv. 16 a 18, e de novo nos vv. 29 e 30. Paulo diz: "Somos filhos de Deus. E, se somos filhos, somos também herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo; se com ele sofrermos, para que também com ele sejamos glorificados. Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não são para comparar com a glória por £ vir a ser revelada em nós" (Rm 8.16-18); e ainda, "Por­quanto aos que de antemão conheceu, também os pre­destinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou" (Rm 8.29,30).
Qual era o objetivo de Deus? Era que o Seu Filho Je­sus Cristo pudesse ser o primogênito entre muitos irmãos que seriam todos transformados à Sua imagem. Como realizou Deus esse objetivo? "Aos que justificou, a esses também glorificou". Então, o propósito de Deus na criação e na redenção foi fazer de Cristo o primogênito entre muitos filhos glorificados.
Em João 1.14, aprendemos que o Senhor Jesus era o "unigênito Filho de Deus: "E o Verbo se fez carne e ha­bitou entre nós, e vimos a Sua glória, glória como do unigênito do Pai". Isto significa que Deus não tinha outro filho senão Este. Ele estava com o Pai desde toda a eter­nidade. Mas aprendemos que Deus não Se satisfazia em que Cristo permanecesse como o Filho Unigênito. Desejava também que Ele Se tornasse o Seu primogênito. Como podia um filho unigênito vir a ser o primogênito?
E tendo o pai, mais filhos; o primeiro filho que você tiver, será seu unigênito, mas se tiver outros, este se torna o primogênito.
O propósito divino na criação e na redenção foi que Deus tivesse muitos filhos. Ele nos desejava, e não Se satisfazia sem nós. Há algum tempo, visitei o Sr. George Cutting, autor do famoso folheto "Segurança, Certeza e Gozo". Quando fui levado à presença deste velho crente, de noventa e três anos, ele tomou a minha mão nas suas, e, de maneira calma e ponderada, disse: "Irmão, sabe, eu não posso passar sem Ele, e, sabe, Ele não pode passar sem mim". Embora estivesse com ele por mais de uma hora, a sua idade avançada e a sua fraqueza física tornaram impossível manter qualquer conversa, mas o que fi­cou gravado na minha memória, desta entrevista, foi a sua freqüente repetição destas duas frases: "Irmão, sabe, eu não posso passar sem Ele, e, sabe, Ele não pode passar sem mim".
Ao ler a história do filho pródigo, muitas pessoas se impressionam com as tribulações que lhe sobrevieram, pensando no que ele passou de desagradável. Mas não é e essa a lição da parábola, cujo coração é: "Meu filho esta­va perdido e foi achado". A questão não é o que o filho sofre, mas o que o pai perde. É Ele o sofredor; é Ele quem perde. Uma ovelha se perde — de quem é a perda? Do pastor. Perde-se uma moeda — de quem é a perda? Da mulher. Perde-se um filho — de quem é a perda? Do pai. É esta a lição de Lucas capítulo 15.
O Senhor Jesus era o Filho Unigênito: não tinha irmãos. O Pai, porém, enviou o Filho, a fim de que o Unigênito pudesse também ser o Primogênito, e o Filho amado tivesse muitos irmãos. Nisto reside toda a histó­ria da Encarnação e da Cruz; e temos aqui, finalmente, o cumprimento do propósito de Deus: "Conduzindo « muitos filhos à glória" (Hb 2.10).
Lemos em Rm 8.29: "muitos irmãos", e em Hb 10.10: "muitos filhos". Do ponto de vista do Senhor Jesus Cristo, trata-se de "irmãos"; do ponto de vista de Deus Pai, trata-se de "filhos". Ambas as palavras, neste contexto, expressam a idéia de maturidade. Deus procura filhos adultos, e mais do que isso, não deseja que vivam num celeiro, numa garagem ou no campo: quer levá-los para o a Seu lar. Deseja que compartilhem da Sua glória. É esta a explicação de Rm 8.30: "Aos que justificou, a estes também glorificou". A filiação — a expressão plena do Seu Filho — é o propósito de Deus nos "muitos filhos". Como poderia Ele realizar isto? Justificando-os e depois, glorificando-os. Deus não Se deterá aquém daquele alvo.
Ele Se propõe a ter filhos com Ele na glória, filhos perfeitos e responsáveis. Providenciou para que todo o Céu fosse habitado com filhos glorificados. Foi este o Seu propósito na redenção.

O grão de trigo

Como foi efetuada a obra de Deus em tornar Seu Fi­lho Unigênito em Primogênito? A explicação se acha em João 12.24: "Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo, caindo em terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, produz muito fruto". Este grão era o Se­nhor Jesus, o único que Deus tinha no universo; não ti­nha segundo grão. Deus colocou este único grão na terra, onde morreu, e, na ressurreição, o grão unigênito se transformou em grão primogênito, porque dele se derivaram muitos grãos.
Em relação à Sua divindade, o Senhor Jesus permanece único como "unigênito Filho de Deus". Todavia, há um sentido em que, da ressurreição em diante, e por to­da a eternidade, é também o primogênito, e a Sua vida, a partir de então, se acha em muitos irmãos. Assim, nós, que somos nascidos do Espírito, somos feitos "co-participantes da natureza divina" (II Pe 1.4), não por nós mesmos, e, sim, em dependência de Deus e por virtude e de estarmos "em Cristo". Recebemos "o espírito de adoção, baseados no qual clamamos: Aba, Pai. O próprio Espírito testifica com o nosso Espírito que somos filhos de Deus" (Rm 8.15, 16). Foi por meio da Encarnação e da Cruz que o Senhor Jesus o tornou possível. Nisto se satisfez o coração de Deus, o Pai, porque pela obediência do Filho até à morte, alcançou os Seus muitos filhos.
O primeiro e o vigésimo capítulos de João são muito preciosos a este respeito. No princípio do seu Evangelho, João nos diz que Jesus era o "unigênito Filho do Pai". No fim do Evangelho, diz que o Senhor Jesus, depois de ter morrido e ressuscitado, disse a Maria Madalena: "Vai ter com meus irmãos, e dize-lhes que Eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus" (João 20.17). Até aqui, neste Evangelho, o Senhor falou muitas vezes de "o Pai" ou de "meu Pai". Agora, na ressurreição, acrescenta: "...e vosso Pai". É o Filho mais velho, o Pri­mogênito, que fala. Pela Sua morte e ressurreição, muitos irmãos foram trazidos para a família de Deus, e, por­tanto, no mesmo versículo, Ele os chama: "Meus irmãos". "Ele não se envergonha de lhes chamar irmãos" (Hb. 2.11).

A escolha que Adão tinha que fazer

Deus plantou grande número de árvores no Jardim no Éden, mas, "no meio do jardim" — isto é, num lu­gar de especial proeminência, plantou duas árvores: a árvore da vida, e a árvore do conhecimento do bem e do mal. Adão foi criado inocente: não tinha o conheci­mento do bem, nem do mal. E Deus o colocou no Jar­dim, dizendo com efeito: "Ora, o Jardim está cheio de árvores repletas de frutos, e podes comer livremente do fruto de todas as árvores, mas, no meio do Jardim, há uma árvore chamada 'a árvore do conhecimento do bem e do mal' — não deves comer dela porque, no dia em que o fizeres, certamente morrerás. Mas, lem­bra-te, o nome da outra árvore, ao pé dessa, é 'árvore da Vida'."
Qual é, pois, o significado destas duas árvores? Adão, por assim dizer, foi criado moralmente neutro — nem pecador nem santo, mas inocente — e Deus colocou estas duas árvores no Jardim para que ele pudesse pôr em prática a faculdade de livre escolha de que era dota­do. Podia escolher a árvore da vida, ou escolher a árvore do conhecimento do bem e do mal.
Ora, o conhecimento do bem e do mal, embora a Adão tivesse sido proibido, não é mau em si mesmo. Sem ele, Adão está limitado e não pode, por si mesmo, decidir em questões de ordem moral. O julgamento do que é certo e bom não lhe pertence, e, sim, a Deus, e o único recurso de Adão, quando tem que encarar qualquer problema, é remetê-lo a Deus. Assim, há no Jardim uma vida que depende totalmente de Deus. Estas duas árvores representam, portanto, dois princípios profundos; simbolizam dois planos de vida, o divino e o humano. A "árvore da vida" é o próprio Deus, porque Deus é a vida, a mais elevada expressão da vida, bem como a fonte e o alvo da vida. O que representa o fruto? É nosso Senhor Jesus Cristo. Não podemos comer a árvore, mas podemos comer o seu fruto. Ninguém é capaz de receber Deus, como Deus, mas podemos receber o Senhor Jesus Cristo. O fruto é a parte comestível, a parte da árvore que se pode receber. Podemos assim dizer, com a devida reverência, que o Senhor Jesus Cristo é realmente Deus, em forma recebível: Deus, em Cristo, po­de ser recebido por nós.
Se Adão tomasse da árvore da vida, participaria da vida de Deus e assim se tornaria um "filho" de Deus, no sentido de ter em si mesmo vida derivada de Deus.
Teríamos então a vida de Deus em união com o ho­mem: uma raça de homens tendo em si a vida de Deus e vivendo em constante dependência de Deus para a manifestação dessa vida. Se, por outro lado, Adão se voltasse na direção contrária e tomasse do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, desenvolveria então a sua própria humanidade, de forma natural, e separadamente de Deus. Alcançando um elevado grau de façanhas e conhecimentos pelas suas conquistas e aquisições como ser auto-suficiente, teria em si mesmo o poder de formar opiniões independentemente de Deus, não teria, porém, a vida divina em si mesmo. Era, portanto, essa a alternativa que estava perante ele. Escolhendo o caminho do Espírito, o caminho da obediência, poderia tornar-se um "filho" de Deus, de­pendendo de Deus para a manifestação da sua vida ou, seguindo o curso natural, ele podia, por assim dizer, dar o toque final em si mesmo, tornando-se um ser auto-dependente, julgando e agindo separadamente de Deus. A história da humanidade é o resultado da escolha que Adão fez.

A escolha de Adão, a razão da Cruz

Adão escolheu a árvore do conhecimento do bem e do mal, tomando assim uma posição de independência. Ficou sendo o que até hoje é o homem (aos seus próprios olhos): homem "plenamente desenvolvido" que pode comandar o conhecimento, decidir por si mesmo, prosseguir ou deter-se. Desde então, tinha "entendimento" (Gn 3.6). Mas, a conseqüência que daí resultou, envol­vera cumplicidade com Satanás e o colocara sob o juízo de Deus. Foi por isso que o acesso à árvore da vida lhe teve de ser, daí em diante, vedado.
Dois planos de vida foram colocados perante Adão: o da vida divina, em dependência de Deus, e o da vida hu­mana, com os seus recursos "independentes". Foi peca­minosa a escolha que Adão fez, do último, porque assim se tornou aliado de Satanás para frustrar o eterno propó­sito de Deus. Escolheu o desenvolvimento da sua própria humanidade, querendo se tornar um homem melhor ou talvez perfeito, segundo o seu próprio padrão — porém, separado de Deus. O resultado, no entanto, foi a morte, porque ele não tinha em si mesmo a vida divina impres­cindível para realizar em si o propósito de Deus, e aca­bou escolhendo ser um agente "independente", do Ini­migo. Assim, em Adão, todos nos tornamos pecadores, dominados por Satanás, sujeitos à lei do pecado e da morte e merecendo a ira de Deus. Vemos, assim, a razão divina da morte e da ressurreição do Senhor Jesus. Vemos, também, a razão divina da verdadeira consagração — para nos considerarmos mortos para o pecado mas vivos para Deus, em Cristo Jesus, e para nos apresentarmos a Deus como vivos dentre os mortos. Todos devemos ir à Cruz, porque o que está em nós, por natureza, é uma vida bem nossa, sujeita à lei do pecado. Adão escolheu uma vida própria ao invés da vida divina; assim, Deus teve que pôr termo a tudo quanto era de Adão. O nosso "velho homem" foi crucificado.
Deus incluiu-nos todos em Cristo e crucificou-O, como o último Adão, aniquilando assim tudo o que pertence a Adão.
Depois, Cristo ressuscitou em nova forma; ainda com um Corpo mas "no espírito"; não mais "na carne". "O último Adão, porém, é espírito vivificante" (I Co 15.45). O Senhor Jesus agora tem um Corpo ressurreto, espiri­tual, glorioso e, desde que não está mais na carne, pode agora ser recebido por todos. "Quem de mim se alimenta, por mim viverá", disse Jesus (João 6.57). Os judeus acha­ram revoltante a idéia de comer a Sua carne e beber o Seu sangue, mas, evidentemente, não podiam recebê-Lo então, porque Ele estava, literalmente, na carne. Agora que Ele está no Espírito, cada um de nós pode recebê-Lo, e é participando da Sua vida ressurreta que somos constituídos filhos de Deus. "A todos quan­tos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus... os quais nasceram... de Deus" (João 1.12,13). Deus não está empenhado em reformar a nossa vida; o Seu pensamento não consiste em trazê-la a certo grau de aperfeiçoamento, porque a nossa vida situa-se num plano essencialmente errado. Naquele plano, Ele não po­de agora levar o homem à glória. Tem que criar um novo homem, nascido de Deus, nascido de novo. A regeneração e a justificação caminham juntas.

Aquele que tem o Filho tem a vida

Há vários planos de vida. A vida humana situa-se entre a vida dos animais inferiores e a vida de Deus. Não podemos lançar uma ponte sobre o golfo que nos distan­cia do plano inferior ou do plano superior, e a separação que há entre a nossa vida e a de Deus é infinitamente superior à que existe entre a nossa vida e a dos animais. Os seus filhos nasceram na sua família e recebem seu no­me porque você lhes comunicou a sua própria vida. Quanto ao seu cão, talvez seja inteligente, bem compor­tado, um cão notável, mas nunca poderia ocupar a posi­ção de ser seu filho. A questão não é: "Trata-se de um cão bom ou mau?" mas, simplesmente: "É um cão!" Não é por ser mau que fica desqualificado para ser filho: é simplesmente por ser cão. O mesmo princípio se apli­ca às relações entre o homem e Deus. A questão não é você é mais ou menos bom ou mau, mas, simplesmente: "É homem!" Se a sua vida está num plano inferior ao da vida de Deus, então você não pode pertencer à família divina. A nossa única esperança, como homens, está em receber o Filho de Deus, e, quando o fazemos, a Sua vida em nós constituir-nos-á filhos de Deus.
O que nós hoje possuímos em Cristo é mais do que Adão perdeu. Adão era apenas um homem desenvolvido. Permaneceu naquele plano e nunca possuiu a vida de Deus. Mas nós, que recebemos o Filho de Deus, recebemos não só o perdão dos pecados, mas também recebemos a vida divina que estava representada no Jardim pela árvore da vida. Pelo novo nascimento, recebemos algo que Adão nunca tivera e não chegara a alcançar.

Todos vêm de um só

Deus deseja filhos que sejam co-herdeiros com Cristo, na glória. Este é o Seu alvo, mas como pode Ele realizá-lo? Voltemos agora a Hb 2.10,11: "Porque convinha que aquele, por cuja causa e por quem todas as coisas existem, conduzindo muitos filhos à glória, aperfeiçoasse por meio de sofrimento o Autor da salvação deles. Pois, tanto o que santifica, como os que são santificados, todos vêm de um só. Por isso é que ele não se envergonha de lhes chamar irmãos, dizendo: "A meus irmãos declararei o teu nome, cantar-lhe-ei louvores no meio da congregação".
Mencionam-se aqui duas entidades: "muitos filhos" e "o Autor da salvação deles", ou, noutras palavras, "o que santifica" e "os que são santificados". Mas, diz-se que estas duas entidades "vêm de um só". O Senhor Je­sus, como homem, derivou a Sua vida de Deus e (noutro sentido, mas igualmente verdadeiro) derivamos a nossa vida de Deus. Ele foi "gerado... do Espírito Santo" (Mt " 1.20), e nós fomos "nascidos do Espírito", "nascidos... de Deus" (João 3.5; 1.13). Assim, diz Deus, somos todos de Um. "De", no Grego, significa "para fora de". O Fi­lho primogênito e os muitos filhos são todos, embora em sentidos diferentes, tirados "para fora de" a única Fonte da vida. Temos hoje a vida que Deus tem no Céu, porque Ele a transmitiu a nós aqui na terra. Este é o precioso "dom de Deus" (Rm 6.23).
É por essa razão que podemos viver uma vida de santi­dade, porque não se trata de a nossa vida ter sido modifi­cada, e sim, de a vida de Deus ter sido implantada em nós.
Já notou que, nesta consideração do propósito eterno, toda a questão do pecado deixa, finalmente, de existir? O pecado entrou com Adão e mesmo quando ele for re­solvido, como tem de sê-lo, apenas somos levados à posi­ção em que Adão se encontrou. Mas, relacionando-nos de novo com o propósito divino — restaurando-nos o acesso à árvore da vida — a redenção nos deu muito mais do que Adão jamais teve. Fez-nos participantes da própria vida de Deus.

Extraído do Livro ( A Vida Cristã Normal ) Disponível para download no Filho Varão.

Irmãos em Cristo Jesus.

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Mt 5:14 "Vós sois a luz do mundo"