sábado, 1 de agosto de 2009

Depósito, Ortodoxia e Espírito- Gino Iafrancesco

Depósito, Ortodoxia e Espírito, O que Deus tem confiado à Igreja.
O bom depósito

A palavra chave do que estivemos olhando na revista anterior é a palavra «administração». Agora, mediante Deus, vamos passar a um segundo conceito, relacionado também com o de administração: o depósito.
Administração é o acerto administrativo de Deus, para que o que é dele e para ele, circule, e produza o efeito que Deus quer produzir. Agora, relacionado com essa administração, devemos ter consciência do depósito. Para a igreja foi encomendado nas mãos, no coração, no espírito, podemos dizer, no ventre, um depósito.
Agora, este depósito tem vários aspectos. Então, abramos a Bíblia na segunda epístola de Paulo a Timóteo, que poderíamos chamar como o testamento do apóstolo Paulo antes de morrer. E justamente por isso, por ser como uma espécie de testamento tem essa configuração de encargo, de encomenda.
Algo precioso que veio do céu para ficar na terra e produzir fruto para Deus foi encomendado aos santos da parte de Deus o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Então, a igreja deve tomar consciência de que ela é um vaso depositário de um conteúdo riquíssimo.

Dois aspectos do depósito
E é um conteúdo que, antes de entrar em detalhe, vamos ver de maneira global em dois aspectos principais: um conteúdo interior, um conteúdo dinâmico, que podemos chamar espiritual. Esse conteúdo interior é uma essência que o Senhor converte e distribui como uma fragrância; é uma realidade espiritual. Logicamente que é mais que palavras; mas, como diz a Escritura, é algo que também falamos.Então, vamos tomar consciência desses dois aspectos. Primeiro, o depósito, o pacote celestial que o Senhor pôs nas mãos e no espírito da igreja, como realidades espirituais, e também a sua administração falada, o ministério da Palavra, do que o Senhor nos deu.Poderíamos relacionar o aspecto da Palavra com a ortodoxia da verdade. Logicamente, não vamos falar só da ortodoxia da verdade, mas também da verdade da ortodoxia, que é o seu conteúdo, o seu espírito. Então, esses dois aspectos, no capítulo 1 da 2ª epístola de Paulo a Timóteo, aparecem claramente nos versos 13 e 14. Vejamos como o Espírito do Senhor movia o apóstolo Paulo neste depósito e nestes dois aspectos do depósito.O aspecto exterior também é da parte de Deus, porque o Senhor não só se encarregou do vinho, mas também do odre. O Senhor faz corresponder o vinho com o odre e o odre com o vinho. Para cuidar do vinho, ele se ocupou também do odre, porque o vinho novo em odre velho se rompe; rompe o odre e o vinho é derramado e se perde. De maneira que o Senhor, que aprecia o vinho, dá-nos o odre. Claro que um odre sem vinho seria uma tragédia, mas o Senhor se encarrega das duas coisas.Às vezes, nós somos muito suscetíveis e dedicados somente ao odre, e nos falta o principal, que é o próprio Senhor, que é o próprio vinho. Mas o Senhor se encarregou das duas coisas, do que é de dentro e do que é de fora, porque ele é o Senhor de tudo.«Retenhas…». O verbo que utiliza aqui é «reter». No capítulo seguinte é «guardar». Ou seja, é uma riqueza que foi confiada à igreja para ser retida e para ser guardada. Por isso, em outros contextos desta mesma carta e da carta anterior, o apóstolo fala de guardar, fala de encomenda.Por exemplo, no final do capítulo 6 de 1ª Timóteo, no verso 20, diz: «Timóteo, guarda…». Há um conteúdo. O Senhor Jesus também fala como Paulo; diz à igreja: «Lembra-te do que tens recebido, e guarda-o», e adverte à igreja em Sardes que algumas das coisas que vieram do céu, o que foi confiado à igreja, algumas coisas foram se perdendo; essas realidades e sua expressão foram se perdendo na igreja. Então o Senhor diz: «…não tenho achado as tuas obras perfeitas».As obras da igreja em Sardes já não eram perfeitas, porque tinha perdido algo do que lhe tinha sido confiado. A igreja deve ter um claro conhecimento espiritual, uma clara consciência de que algo específico, definido e completo lhe foi confiado desde o começo ao colégio dos apóstolos, para que dali passasse aos anciões e às igrejas. E que, ainda que o diabo tenha procurado separar esse depósito da igreja, o Espírito Santo tem velado inclusive para restaurar e recuperar a plenitude do conteúdo, e cremos que o Espírito Santo continua nessa vigilância, porque uma das suas tarefas é conduzir a igreja à toda verdade.Então, Paulo diz: «Timóteo, guarda o que te foi encomendado…». É uma encomenda, um pacote espiritual, algo definido, algo claro, do qual eles, os primeiros depositários, tinham clara consciência, e velavam espiritualmente sobre isso. E essa mesma consciência nós devemos ter. Às vezes não temos consciência do depósito; às vezes temos gosto por algumas das coisas espirituais, das coisas cristãs, das coisas bíblicas; o que nos interessam, e estamos com elas, ruminamo-las, e outras descuidamos; mas justamente aquilo que descuidamos é onde se faz o buraco, e por aí penetra Satanás.Por isso precisamos ter consciência de sermos juntos um vaso coletivo, a quem foi confiado algo imenso e rico, que todos devemos conservar. E não só conservar, mas também, diz Paulo que essa palavra de Deus, que é completa, tem o poder de sobreedificar na graça de Deus. Ou seja, a própria palavra de Deus vai se enriquecendo; à medida que o povo de Deus a desfruta, a Palavra vai ficando cada vez mais preciosa. Ela é a mesma de sempre, mas para nós é cada vez mais preciosa; cada vez a vemos melhor, cada vez a compreendemos melhor, podemos relacionar uma parte com outra de uma maneira melhor, porque toda ela às vezes nos esconde e às vezes nos revela o nosso Senhor.A princípio, parece que ele está escondido na Palavra, e a princípio nem sequer relacionamos a Palavra com Cristo, e em algumas porções da Palavra não vemos ainda nada do Senhor, mas com o tempo o que é próprio dele vai aparecendo em todos os aspectos da Palavra. E todos estão relacionados em uma cosmovisão, uma visão completa que vai de eternidade a eternidade, e que apresenta o nosso Deus, a beleza do nosso Deus e Cristo, a beleza do seu Espírito, e, portanto a beleza que a igreja herda, que a igreja vai cada vez mais adquirindo na medida em que desfruta do Senhor, e a palavra do Senhor produz fruto, germina, na vida da igreja.Então, voltando para 2ª Timóteo, vemos estes dois aspectos: o aspecto da ortodoxia da verdade, e o da verdade ou realidade espiritual da ortodoxia. Os dois, intimamente ligados, um no 13 e outro no 14.«Retenha a forma das sãs palavras que de mim ouviste, na fé e amor que há em Cristo Jesus» (2ª Tim. 1:13). Nessa frase é manifestado o cuidado do Espírito em relação à ortodoxia da verdade – a forma das sãs palavras. Há umas palavras, que foram inspiradas pelo Espírito, que transmitem a verdade, e essas palavras é o que estamos chamando a ortodoxia, que poderíamos identificar com o Novo Testamento como cumprimento ou realização do Antigo Testamento.Poderíamos dizer que a Bíblia é o conteúdo da ortodoxia, mas logicamente não é só uma ortodoxia seca, meramente doutrinária, intelectual e externa, ainda que também implica. Deus fez o ser humano completo; cada parte do ser humano tem a sua função, e cada função tem que estar integrada, sujeita à cabeça que é Cristo. Assim que a doutrina tem também que sujeitar-se a Cristo. Os assuntos doutrinários, teológicos, ideológicos, também devem expressar a Cristo. Esse é um aspecto do que Deus criou no homem, e deve submeter-se a Cristo.Mas antes de terminar o verso 13, já começa a transitar para o conteúdo interior. Começa a dizer que essa forma das sãs palavras, de onde vem essa expressão que também é paulina, sã doutrina, começa a mostrar que não é algo meramente exterior, não somente uma correção doutrinária, não somente uma teologia correta. Paulo diz que essas palavras são «na fé e amor que há em Cristo Jesus». Cristo Jesus é a realidade da fé e a realidade do amor. Paulo dizia: «A vida que agora vivo, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou e a si mesmo se entregou por mim». Ele não diz a fé no Filho, mas a fé do próprio Filho.Paulo fala da fé do Filho. Ou seja, que essas palavras são palavras na fé, muito diferentes das simples palavras, as repetições de papagaios. Os papagaios também dizem palavras; eles poderiam aprender o credo de Nicéia e repeti-lo de cor. Mas não é só essa a correção que o Senhor espera, a vigilância que ele espera de sua igreja quanto ao depósito. Os santos não são papagaios, mas filhos e filhas de Deus, nascidos de mistério, por um elemento celestial que desceu do céu e que enche as palavras e o testemunho da igreja, e que é o que precisam as pessoas que têm que receber o testemunho.As pessoas precisam ser tocadas pelo Espírito da Palavra. Nós também necessitamos a realidade da Palavra, e esse é o trabalho do Espírito Santo – lhe dar substantividade, realidade à Palavra, e passar essa realidade a nós através da fé, pois estas palavras são realidade na fé e no amor.Graças a Deus que em Cristo existe a fé e existe o amor, e as palavras do Senhor nunca estão separadas da fé. Por isso Paulo dizia que ele, primeiro, antes de falar, teve que crer. Diz: Cri que as promessas de Deus são verdadeiras, cri que o que Deus diz é verdade. Creio que o Senhor é fiel à sua Palavra; creio que o seu Espírito Santo está aí, para substantivar, para sustentar as promessas de Deus com fidelidade, e realizar o que só ele pode realizar.Mas Paulo cria; por isso, ele disse: «Cri, por isso falei». Então, as palavras, a forma das sãs palavras, a sã doutrina de Cristo e dos apóstolos, não é só uma ortodoxia. Elas são na fé e são no amor, e a fé e o amor também são em Cristo, e são um presente. Graças a Deus, que Deus nos libertou da necedade de ter que imitar a fé ou imitar o amor. Deus sabe que nós, em nós mesmos, não temos nem fé nem amor; mas ele se encarregou de nos dar fé, um dom de Deus, e derramar o amor pelo Espírito. Isso é um primeiro trabalho de Deus o Pai, do Filho e do Espírito Santo: dar-nos a fé e derramar o seu Espírito de amor. E isto, Deus faz.Graças a Deus, porque já nos encontramos com Deus. Deus já nos alcançou, já nos tocou, o celestial já entrou em nosso espírito, e agora estamos conhecendo uma realidade pela fé, uma realidade espiritual que transcende o que os nossos olhos vêem e os nossos ouvidos ouvem, porque estamos diante do Senhor, crendo em sua palavra. Não estamos diante de homens, nem estamos considerando a Bíblia como palavra meramente de homens.As palavras do Senhor Jesus são o falar de Deus; as palavras dos apóstolos não são de homens, são a mesma administração que vem do céu, do Pai pelo Filho e agora pelo Espírito, através dos apóstolos, através do Novo Testamento. Essas palavras nos tem tocado. No princípio, nem entendíamos o que líamos, mas pouco a pouco começamos a entender. E aí entrou a nova vida em nosso ser, em nosso ventre espiritual, e esse menino começou a formar-se no ventre da igreja. Cristo começou a crescer na mulher que tem dores de parto. Mas Cristo já está se formando nela, e essas são coisas de fé, de fé e de amor.«Retenha…». Paulo não diz reter somente a fé, mas inclusive «a forma das sãs palavras… na fé e amor que há em Cristo Jesus». Temos que reter não só as sãs palavras, mas também a fé e o amor dessas palavras, porque as palavras de Deus são em fé e são em amor. E assim temos que retê-las, e são parte do depósito. Assim na última frase do verso 13, já nos deslocamos para a realidade interior; da forma das sãs palavras, descobrimos que essas sãs palavras são na fé, são no amor, e a fé e o amor são em Cristo.Então, Paulo repete de novo, como é o estilo hebraico de repetir as coisas, uma frase e logo outra, e passa ao verso 14 já completamente dentro, atrás do véu. Diz: «Guarda…», que é como a «Retenha…». «Guarda o bom depósito». E agora nos diz qual é o segredo para poder guardar, para reter a frescura da palavra de Deus. Porque às vezes nós na mera ortodoxia exterior fazemos como papagaios, aprendemos o credo correto, mas desvinculado da fé e do amor, desvinculado da dependência do Senhor. Trasladamos do Senhor outra vez para nós mesmos. Já não sabemos as coisas, então as repetimos sem dependência do Senhor, sem atender a ele no espírito, sem nos voltarmos no espírito para ele.Mas Paulo diz: «Guarda o bom depósito pelo Espírito Santo, que habita em nós». Esse já é um fato – o Espírito Santo já habita em nós, e ele não está ocioso, e uma de suas funções é nos ajudar a guardar o bom depósito, fazer permanecer a palavra do Senhor fresca.O Espírito Santo, e somente o próprio Espírito Santo é a frescura da palavra de Deus. Por isso, sempre temos que sair de nós, nos tornarmos para o Senhor e solicitar o seu toque, para que ele, em sua fidelidade, nos renove outra vez a frescura do Espírito. O irmão Orville Swindoll há muitos anos em Buenos Aires compartilhou uma mensagem que ele intitulou «Para uma renovação constante», justamente enfatizando este segredo.Qual era o segredo de uma renovação constante? A vida religiosa às vezes entra em uma inércia, e nos acostumamos a fazer as coisas sem depender do Senhor. Até a própria oração pode tornar-se algo rotineiro, algo apenas de postura; é como se fosse um dever que, como cristãos, devemos obedecer. Então, temos que orar, temos que ler a Bíblia, temos que pregar, e vamos fazendo muitas coisas por rotina ou por inércia. E assim as coisas vão morrendo, porque a realidade das coisas é o Espírito, e o Espírito habita em nós.E é uma grande necedade nossa que, tendo o Espírito Santo morando em nós, nós não atentamos para o Espírito Santo, não nos voltamos para ele, não lhe tocamos a porta e lhe dizemos: ‘Senhor, não quero dar um passo se não estiver comigo’. Como Moisés dizia: «Senhor, se tu não fores conosco, não nos tire daqui, nos deixe aqui tranqüilos. O que nós vamos fazer lá? Se não fores conosco, não nos tire daqui».Mas o Senhor prometeu ir conosco, prometeu estar conosco todos os dias, até o fim do mundo, e a fidelidade dele não depende da nossa excelência, porque ninguém é excelente, a não ser o Senhor. Nós somos frágeis, pessoas más, totalmente corruptas, capazes de qualquer barbaridade, e por isso mesmo temos que estar nos voltando para o Senhor. ‘Senhor, não me deixe solto como um cão raivoso, porque eu vou causar um dano em sua vinha. Tenha misericórdia, Senhor, guarda-me! Mantenha-me crucificado, porque eu mesmo não me sinto crucificado se não for pelo poder da tua cruz’.Por isso, necessitamos que o Senhor, constantemente, esteja nos retendo na cruz e ao mesmo tempo esteja nos ajudando. E ele está completamente tendo prazer de fazer isto, porque isso é o que ele quer fazer, é o que ele é capaz de fazer, e ele deseja poder fazê-lo. Então, é por meio do Espírito Santo que guardamos o bom depósito.O bom depósito se refere ao dispensar-se de Deus, a administração do próprio Deus. Há a administração de Deus, da multiforme graça de Deus, dos mistérios de Deus; mas nessa administração Deus tem que estar, tem que estar o Espírito. Essa é a diferença fundamental entre o Antigo Testamento, o antigo pacto, que era o da mera letra, que era o dos mandamentos, mas que não tinha nada haver conosco, que estava fora de nós, em tábuas de pedra, em rolos, nos filactérios, nas paredes e nas vergas das portas, mas não estava em nosso espírito.Mas, no Novo Testamento, o Senhor, em sua bondade, decidiu nos dar a seu Filho. O verbo é «dar». Não nos vendeu; nunca teríamos podido pagar, nunca teríamos condições de merecer, mas Deus deu a seu Filho; deu-nos vida quando estávamos mortos; deu-nos o espírito, que é um dom; deu-nos a fé, deu-nos tudo.Então, como o temos, senão somente crendo nele? Contando com ele, contando que ele é fiel e nos ajudará. E essa deve ser a nossa dependência constante. ‘Senhor, se tu queres fazê-lo, tu o farás. Se quiser que eu esteja ali, amém, mas tu tens que estar, porque se não, o que eu faço sozinho? Tu tens que estar’. E ele o faz, e ele sempre está com a igreja, sempre está com cada um de nós, porque ele é fiel.Ele quer fluir, mas às vezes nós o ofendemos; então, com essas retrações e contrações do Espírito, ele vai corrigindo, para que não sejamos ofensivos em sua presença. Nossa jactância o ofende; nosso menosprezo a outros o ofende. Qualquer atitude nossa que não é própria, ele tem que assinalá-la, para que nós possamos estar a seus pés, e quanto mais escondidos e desaparecidos, melhor, e enquanto olharmos para ele, muito melhor. Por isso, mediante o Espírito, o depósito, a frescura de toda a palavra de Deus, de toda a visão que foi confiada, mantém-se fresca. (Continuará).Resumido de uma mensagem ministrada em Temuco, em agosto de 2008

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