quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Princípios de igreja no Tabernáculo- A. McShane (Parte I)

A maioria dos escritores, ao tratar do Tabernáculo, destaca as variadas glórias de Cristo que são tão ricamente ilustradas nele. Este é, sem dúvida alguma, o aspecto mais importante e claro do ensino do Tabernáculo, ao qual são perfeitamente aplicáveis as palavras usadas dos céus no Salmo 29:9: “… no Seu templo, cada um [lit., “tudo”, ARA] fala da Sua glória”. Há, porém, outra forma de olharmos para este quadro do Velho Testamento — podemos ver nele ilustrações dos santos no seu testemunho coletivo.

Não é difícil provar que esta é uma aplicação bíblica e legítima da figura, pois como Deus habitou naquele edifício antigo e o descreveu como Seu santuário, agora, da mesma forma, Ele habita no meio do Seu povo reunido. Paulo escreveu, da igreja em Corinto: “Vós … sois o templo [santuário] de Deus e … o Espírito de Deus habita em vós” (I Co 3:16). Nenhuma construção material pode, agora, ser chamada de Casa de Deus, pois o mesmo apóstolo disse: “Deus … não habita em templos feitos por mãos de homens” (At 17:24). Ele ainda tem, porém, o Seu santuário e habitação. O Senhor mesmo disse: “… onde estiverem dois ou três reunidos em Meu nome, aí estou Eu no meio deles” (Mt 18:20). Esta promessa bendita ainda não foi retirada, um fato que muitos têm provado por experiência própria. Nem é apenas que deduzimos que Sua presença esteja ali, pois a mesma igreja em Corinto foi ensinada que mesmo aqueles que visitassem suas reuniões, ao contemplarem a ordem divina sendo seguida no meio da igreja, confessariam publicamente que Deus estava verdadeiramente entre eles (I Co 14:25).
Estas poucas referências são suficientes para deixar claro que, ao considerarmos o Tabernáculo como uma ilustração de características de uma igreja neotestamentária, não estamos viajando pelos campos da mera imaginação.
Recolhendo os materiais
Os israelitas, assim que Deus revelou Seu propósito quanto ao santuário, começaram a providenciar os materiais brutos necessários para a sua construção. Ficamos impressionados com a quantidade, qualidade e variedade de coisas requeridas — ouro, prata, cobre, madeira, peles, e pedras preciosas. Como é que estas coisas poderiam ser fornecidas por um grupo de pessoas recém-libertadas da escravidão e agora habitando no deserto de Sinai? A resposta é simples: Deus, que é quem pediu-lhes que construíssem, havia previsto o que seria necessário, e em Sua soberania havia providenciado tudo. Os israelitas, ao deixar o Egito, saquearam os egípcios em cumprimento da promessa feita a Abraão, que fora avisado que eles sairiam “com grande riqueza” (Gn 15:14). Os anos de escravidão foram finalmente pagos, como se numa parcela única. Deus agiu de tal forma no coração dos egípcios que eles estavam dispostos a dar praticamente tudo que tinham para se verem livres dos israelitas. Esta riqueza do Egito era não só uma recompensa justa pelo seu trabalho como escravos, mas também o tesouro do qual foram providenciados os materiais necessários para o Tabernáculo.
Em nossos dias, material de um tipo muito diferente é necessário para a construção do santuário de Deus. Ele agora é composto de pecadores salvos, chamados para fora do mundo e associados juntos em testemunho público. Assim como os israelitas encontraram seus tesouros no Egito, assim também encontramos os nossos no mundo ao nosso redor, pois ele é, figurativamente, o banco do qual retiramos os tesouros para o santuário de Deus. Não podemos enfatizar demais que há uma ligação inseparável entre a edificação de uma igreja e a atividade evangelística. Durante os séculos passados a mensagem gloriosa do Evangelho provou seu poder de salvar aqueles que estavam perdendo seu tempo no pecado e nos prazeres, transformando-os em material digno de adornar a igreja de Deus. Não deveríamos ter olhos para ver, em cada pecador com quem entramos em contato, material em potencial para esta finalidade? Ajuda divina será necessária para salvá-los, mas o mesmo Deus que amoleceu os corações dos egípcios pode, ainda hoje, amolecer almas e trazê-las a Si. Há alguns que pensam que o ensino é o dom fundamental na vida de uma igreja, mas se meditarmos um pouco nesta questão veremos que só haverá santos novos para serem ensinados se o Evangelho estiver prosperando. Isto não quer dizer, é claro, que cremos que os novos convertidos devem ser deixados sem receber ensino sobre onde Deus quer que eles se reúnam.
É bem provável que nem todo o material necessário para a construção do Tabernáculo foi trazido do Egito. As tábuas de madeira, os pêlos de cabras, e algumas das peles podem muito bem ter sido encontradas no deserto onde os israelitas estavam acampados. Nisto podemos aprender que outros materiais em potencial para a habitação de Deus encontram-se perto do povo de Deus — suas famílias e seus amigos, por exemplo. Muitos destes são salvos ainda na sua meninice, antes de conhecerem as profundezas de pecado que há no mundo. Qualquer pai ou mãe espiritual desejará para seus filhos não só um lugar no céu, mas um lugar na igreja local. É necessário muito cuidado, porém, para que nenhum destes seja aceito na comunhão da igreja sem ter nascido de novo, ou simplesmente devido a relacionamentos naturais. O fato de serem protegidos e privilegiados são grandes bênçãos, mas não podem substituir a mudança espiritual e pessoal da salvação.
Também devemos acrescentar que muitos destes, apesar de realmente nascidos de novo, dão menos valor à sua posição na igreja do que aqueles que vieram de circunstâncias menos favoráveis. Assim como as tábuas do deserto eram cobertas com ouro do Egito, assim também muitos que foram criados sem conhecimento das coisas de Deus brilham mais, nas igrejas, do que aqueles que pagaram um preço menor para estar ali.
Os tecidos e coberturas
Era impossível aproximar-se do Tabernáculo sem ficar impressionado com a grande quantidade de tecido e peles visíveis no seu exterior. Apesar de ser um centro de riqueza, tanto de ouro quanto de prata, ele não possuía nem pedra nem ferro para protegê-lo. Quão diferente da mentalidade do homem, pois ele não consegue descansar até que seus tesouros estejam protegidos em cofres e fortalezas. O padrão de Deus é totalmente diferente. A Sua habitação possui apenas uma cortina de linho como cerca, e apenas uma cortina de tecido colorido como porta. Qualquer que ousasse invadi-la não seria impedido por tranca ou cadeado, e pelo que sabemos, não havia nem mesmo uma sentinela para vigiar à noite.
Porém o santuário de Deus não era tão vulnerável quanto parecia ser, pois acima dele estava o símbolo da presença de Deus — a nuvem garantia sua proteção de dia e de noite. Enquanto Ele estava próximo, tudo estava bem, e não havia razão para nenhuma preocupação quanto à segurança da Sua casa. A lição aqui não é difícil de perceber. Não há, de certa forma, uma fraqueza muito grande numa igreja local? Somente um grupo de almas salvas, que diariamente sentem suas limitações, permanecendo num testemunho público apesar de todos os elementos adversos que os cercam. “Tendo pouca força” (Ap 3:8) poderia ser escrito para cada uma delas. Uma simples cortina jamais poderia suportar o ataque de algum inimigo, mas ela não estava ali para isto.
Assim também os santos na igreja dependem de Deus para protegê-los de todo mal. Alguns, lamentavelmente, confiaram na sua maturidade e força espiritual mas descobriram depois, para vergonha própria, que facilmente o inimigo os lançava ao chão. Por outro lado, assim como a cortina não poderia ser destruída devido à proteção divina, também não há desculpas quando uma igreja de Deus é derrotada pelo inimigo.
A forma como estas cortinas eram sustentadas nos ensina algumas lições sobre nossa responsabilidade como testemunhas. Em primeiro lugar, elas estavam penduradas em ganchos, de cima. Aqui aprendemos que nossa força vem do alto, portanto depender do poder divino é o segredo para permanecermos em pé.
Em segundo lugar, estavam unidas e dependentes umas das outras. Nós também precisamos de nossos irmãos e irmãs. O individualismo nesta área é uma idéa que a Bíblia desconhece, e aqueles que defendem um testemunho individual ao invés de um testemunho unido estão bem longe do ensino apostólico.
Até que o Senhor venha haverá, como sempre houve, companhias de santos, apesar de algumas vezes serem poucas, que continuarão, apesar de suas fraquezas, a executar a vontade de Deus em testemunho coletivo.
Em terceiro lugar, as cortinas era fortalecidas por pilares, lembrando-nos daqueles que foram levantados no meio dos santos para fortalecê-los e uni-los. A igreja em Filipos era composta não só de santos, mas também de bispos e diáconos. A idéia de que todos têm a mesma responsabilidade numa igreja, e que todos têm a mesma autoridade no seu governo, é totalmente contrária ao modelo do Novo Testamento. Se o Cabeça da Igreja capacita homens para cuidar dos Seus, sejam eles pastores, bispos, guias ou diáconos, é nosso dever reconhecer os tais e tê-los em grande estima por causa do seu serviço.
Em quarto lugar, havia cordas e pinos. Estes nos falam do exercício de fé e das promessas de Deus. Assim como as cordas esticavam-se e seguravam nos pinos, assim nós, pela fé, podemos segurar firmemente nas imutáveis promessas da Palavra. Quando as tempestades assolam uma igreja e ela parece estar em perigo de sucumbir, nesta hora uma palavra de Deus, transmitida e recebida pela fé, muitas vezes fortalece os santos na sua fraqueza.
A nuvem tem, também, seu paralelo hoje. Como o santuário daqueles dias era guardado por Deus, seguro sob a Sua proteção, assim também a igreja é o lugar onde a Sua presença é conhecida e sentida. A igreja em Corinto foi avisada que se alguém corrompesse o santuário de Deus, Deus o destruiria (I Co 3:17). É, portanto, algo muito sério tentar destruir uma igreja, pois Deus é um Deus zeloso, e não deixará de guardar os Seus que confiam somente nEle para sua proteção. Se uma igreja for destruída pelo ensino falso ou por práticas corruptas, podemos concluir que ela já tinha perdido a consciência da presença do Senhor algum tempo antes de isto ocorrer.
Quer visto de longe ou de perto, o tecido do arraial do Tabernáculo deve ter apresentado um contraste muito grande com o deserto no qual estava. Aquela longa tela branca, com aproximadamente dois metros e meio de altura, deve ter impressionado todos que se aproximavam. Nisto aprendemos outra lição sobre o testemunho das igrejas. O linho fino, João nos diz, são as justiças dos santos (Ap 19:8), portanto num mundo corrupto, que cada dia torna-se mais corrupto, o santuário de Deus agora deve ser visto como um lugar limpo, em total contraste com aquilo que o cerca. É bom quando aqueles que conhecem pouco ou nada sobre os princípios bíblicos e os exercícios espirituais de uma igreja são forçados a dizer: “Não sabemos muito sobre as crenças e os ensinos daquele povo, mas sabemos que são as pessoas mais corretas nesta comunidade.” Foi um dia triste para a igreja em Corinto quando ela perdeu, por assim dizer, o seu caráter de linho fino, corrompendo-se pela imoralidade e desonestidade.
Erguendo-se numa das metades deste átrio de linho, com o dobro da altura deste, estava o Tabernáculo propriamente dito. Esta tenda era o único objeto visível do lado de fora, a não ser, é claro, pelos móveis do átrio que talvez pudessem ser vistos pela porta se esta estivesse aberta. Sua aparência não dava nenhuma indicação da beleza e riqueza do seu conteúdo. A cobertura rude de peles de texugos que cobria toda a tenda tinha como função protegê-la dos elementos do deserto, e era, em muitos aspectos, um contraste com o arraial de linho que já consideramos. Sua aparência desbotada nos sugere mais um princípio visto na vida das igrejas locais. O santuário de Deus não foi construído para atrair o olhar natural, nem os Seus santuários hoje deveriam ser moldados de tal forma que satisfaçam os desejos da mente incrédula. É um lugar de repúdio, e sempre testifica ao mundo da sua associação com um Senhor rejeitado. Para se livrarem de tal repúdio, alguns tentam modificar a igreja e moldá-la conforme idéias modernas. Seu local de reunião, acreditam, deveria ser semelhante aos prédios religiosos que existem, e em suas funções sociais (como casamentos) a pompa e beleza demonstradas não deveriam ficar em nada devendo a qualquer comunidade religiosa. Tal ostentação externa é contrária ao padrão do Novo Testamento. Quando uma igreja local perde seu caráter de peregrina perde também, na mesma proporção, seu poder de influenciar para o bem.
Antes de deixar o assunto das coberturas precisamos considerar as portas coloridas — uma dando acesso ao átrio e outra ao santuário propriamente dito. Todos que se aproximavam do Tabernáculo percebiam que só havia uma porta de entrada — uma porta com nove ou dez metros de largura, indicando claramente que havia muita liberdade de acesso. Esta primeira porta com seus quatro pilares nos falaria do Evangelho. Suas cores vivas falam dos vários aspectos de Cristo ali apresentados. Devemos notar que ela era mantida em pé ligada à cortina de linho, dizendo-nos, certamente, que os santos em testemunho unido têm a responsabilidade de proclamar o Evangelho como o único caminho que Deus estabeleceu para que o homem tenha comunhão com Ele. Não há nenhum segredo em nossa posição. O mundo é nossa paróquia, e a graça que nos alcançou está ao alcançe de todos, portanto deveríamos apreciar a honra de estarmos associados com Cristo, que é a única atração para qualquer um que procura aproximar-se de Deus.
O Tabernáculo propriamente dito possuía uma porta muito semelhante à que acabamos de considerar, pois era feita do mesmo material e decorada com as mesmas cores, mas suas medidas eram diferentes. A área das duas portas era igual, mas esta última tinha a metade da largura da primeira, mas o dobro da altura. Não estaria Deus ensinando o Seu povo que o caminho para o santuário é mais restrito que o caminho para o arraial? Somente os sacerdotes tinham acesso ao lugar santo, e mesmo alguns deles não podiam entrar por causa de alguns defeitos. Comunhão com Deus no Seu santuário atual — a igreja local — também possui restrições, pois é claro em I Co 14:23 que nem o infiel nem o indouto pertenciam à igreja em Corinto. É correto afirmar, apesar de surpreendente, que alguém pode estar preparado para ir ao céu, mas não preparado para estar em comunhão com uma igreja. O homem imoral de I Co 5 teve de ser colocado fora da comunhão da igreja, apesar do seu futuro arrependimento sincero provar que ele pertencia realmente ao Senhor. Para inverter a figura, devemos tomar cuidado para não fazermos ambas as portas da mesma largura e altura, pois não temos direito de alargar o que Deus estreitou, nem rebaixar o que Ele elevou.

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Irmãos em Cristo Jesus.

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Mt 5:14 "Vós sois a luz do mundo"

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