segunda-feira, 30 de março de 2009

Calvinismo e Arminianismo- C. H Mackintosh

O erro de uma teologia torcida que mostra um só lado da verdade
C. H. Mackintosh


Extraído do site www.verdadespreciosas.com.ar e Traduzido para o Português pelos irmãos da cidade de Alegrete-RS

Há pouco temos recebido uma longa carta que proporciona uma mui surpreendente prova dos desconcertantes efeitos de uma teologia torcida que mostra um só lado da verdade, e que pretende ser a verdade completa. Nosso correspondente se acha evidentemente sob a influência do que se denomina «a alta escola de doutrina». Em conseqüência, não pode ver o correto de chamar aos incrédulos a que «venham», a que «ouçam», a que «se arrependam» ou a que «creia». Para ele é como dizer a uma árvore silvestre que produza doces maçãs a fim de que se converta em uma macieira.

Pois bem, cremos plenamente que a fé é dom de Deus, e que ela não é conforme a vontade do homem nem por seu poder. Além disso, cremos que nenhuma alma virá jamais a Cristo se não for atraída, forçada, pela graça divina a fazê-lo; portanto, todos os que são salvos tem que dar graças a Deus por sua graça livre e soberana a respeito. Seu cântico é, e sempre será: «Não a nós, oh Senhor, não a nós, senão a teu Nome damos glória, por tua misericórdia, e por amor a tua verdade.»

E nós cremos nisto, não como parte de um determinado sistema de doutrina, senão como a verdade revelada de Deus. Mas, por outro lado, também cremos, e de igual maneira, na solene verdade da responsabilidade moral do homem, posto que a Escritura o ensina claramente, ainda que não o encontremos entre o que se denomina «os cinco pontos da fé dos escolhidos de Deus».

Cremos nestes cinco pontos, até onde estão escritos; mais muitíssimo longe de abranger toda a fé dos escolhidos de Deus. Há extensas áreas da revelação divina que nem remotamente são contempladas, e nem sequer mencionadas, por este sistema teológico defeituoso e mal desenvolvido. Onde achamos o chamamento celestial? Onde está a gloriosa verdade da Igreja como corpo e esposa de Cristo? Onde está a preciosa esperança santificadora da vinda de Cristo para receber aos seus nos ares? Onde vemos que o vasto campo da profecia se abra à visão de nossas almas no que tão pomposamente tem vindo a chamar-se «a fé dos escolhidos de Deus»? Em vão buscaremos a menor aparência dele em todo o sistema com o qual nosso amigo está vinculado.

Pois bem, poderíamos supor por um momento que o bendito apóstolo Paulo aceitaria como «a fé dos escolhidos de Deus» um sistema que exclui o glorioso mistério da Igreja da qual ele foi feito ministro de uma maneira especial? Suponhamos que alguém houvesse mostrado a Paulo «os cinco pontos» do calvinismo como uma declaração da verdade de Deus, o quê haveria dito? O quê?«Toda a verdade de Deus»; «a fé dos escolhidos de Deus»; «todo aquilo que é essencial para a fé»!; mas nem uma sílaba acerca da verdadeira posição da Igreja, de seu chamamento, de sua esperança e de seus privilégios!

Tampouco se faz nenhuma menção do futuro de Israel! Vemos uma completa ignorância ou, no melhor dos casos, um despojamento das promessas feitas a Abraão, Isaque , Jacó e Davi. Os ensinamentos proféticos em seu conjunto são relegadas a um sistema espiritualizante ou alegorizante —falsamente assim chamado— de interpretação, mediante a qual a Israel se priva de sua própria porção, e os cristãos são rebaixados a um nível terreno; e isto nos é apresentado com a elevada pretensão de ser «a fé dos escolhidos de Deus»!

Graças a Deus que ele não é assim! Ele —bendito seja seu Nome— não se tem confinado dentro dos estreitos limites de nenhuma escola teológica, alta, baixa ou moderada. Têm se revelado a si mesmo. Tem declarado os profundos e preciosos segredos de seu coração. Tem feito manifestos seus eternos conselhos com respeito à Igreja, a Israel, aos gentios e a toda a Criação. Os homens se quiserem podem tratar de confinar o vasto oceano dentro de um balde que eles mesmos tem formado, da mesma maneira que pretendem confinar a vasta classe da revelação divina dentro dos débeis cercos dos sistemas de teologia humanos. Não é possível fazer isto, nem se deveria intentar fazê-lo. É muitíssimo melhor deixar de lado os sistemas teológicos e as escolas de teologia, e vir, qual um menino, à eterna fonte da Santa Escritura, para beber dela os vivos ensinamentos do Espírito de Deus.

Nada é mais nocivo para a verdade de Deus, mais dessecante para a alma nem mais subversivo para o crescimento e o progresso espiritual que a mera teologia, já alta ou calvinista, já baixa ou arminiana. É impossível que a alma progrida mais além dos limites do sistema com o qual está relacionada. Caso se me ensinam a considerar «os cinco pontos» como «a fé dos escolhidos de Deus», não me interessará olhar mais além deles; e então um glorioso conjunto de verdades celestiais ficará vedado a minha vista. Ficarei atrofiado e estreito de visão, com uma visão meramente parcial da verdade. Correrei perigo de cair nesse estado de alma fria e endurecida que resulta de estar ocupado com meros pontos de doutrina ao invés de estar com Cristo.

Um discípulo da alta escola de teologia —ou calvinista— não quer ouvir acerca de um Evangelho para o mundo inteiro; do amor de Deus ante o mundo; das boas novas para toda criatura debaixo do céu. Ele só tem conseguido um Evangelho para os escolhidos. Por outro lado, um discípulo da baixa escola —ou arminiana— não quer ouvir acerca da eterna segurança dos que crêem. Sua salvação —alegam— depende em parte de Cristo e em parte deles mesmos. Conforme a este sistema, o cântico dos redimidos deveria sofrer uma modificação: No lugar de cantar simplesmente: «Digno é o Cordeiro», deveríamos adicionar: «E dignos somos também nós.» Podemos ser salvos hoje, e nos perder amanhã. Tudo isto desonra a Deus, e priva ao cristão de toda paz verdadeira.

Ao escrever assim não pretendemos ofender ao leitor. Nada estaria mais distante de nossos pensamentos. Não estamos tratando com as pessoas, senão com escolas de doutrina e sistemas de teologia, procurando com toda veemência que nossos amados leitores consigam abandoná-los de uma vez para sempre. Nenhum sistema teológico compreende toda a verdade de Deus. Todos, é verdade, contém certos elementos de verdade; mas a verdade sempre resulta anulada pelo erro; e mesmo quando achemos algum sistema que, no que vai dele, não contenha mais que a verdade, contudo, se não compreendesse toda a verdade, seu efeito sobre a alma seria pernicioso, porquanto levaria a uma pessoa a se vangloriar de ter toda a verdade de Deus, quando, na realidade, o que tem não é mais que um sistema humano que não considera mais que um só lado da verdade.

Além disso, é raro encontrar um só discípulo de qualquer escola de doutrina que possa enfrentar a Escritura em seu conjunto. Sempre citarão certos textos preferidos que serão reiterados continuamente; mas não se apropriará de uma vasta porção da Escritura. Tome-se, por exemplo, paisagens tais como os seguintes: “Mas Deus... agora manda a todos os homens em todo lugar, que se arrependam” (Atos 17:30). “O qual quer que todos os homens sejam salvos e venham ao conhecimento da verdade” (1.ª Timóteo 2:4). “O Senhor...é paciente para conosco, não querendo que nenhum pereça, senão que todos procedam ao arrependimento” (2.ª Pedro 3:9). E, na última página do inspirado Volume, lemos: “E o que quiser, tome da água da vida gratuitamente” (Apocalipse 21:17).

Temos de tomar estas passagens tal como estão ou temos de introduzir palavras que modifiquem seu sentido de maneira a adaptá-los a nosso particular sistema teológico? O fato é que os tais põem de manifesto a grandeza do coração de Deus, as ações de sua natureza de graça e o vasto aspecto de seu amor. Não é conforme o amante coração de Deus que nenhuma de suas criaturas pereça. Não há tal coisa na Escritura como certos decretos de Deus que relegam a um determinado número de homens à eterna condenação [2] . Alguns podem ser judicialmente entregues à cegueira por seu deliberado recusar da luz (veja-se Romanos 9:17; Hebreus 6:4-6; 10:26-27; 2.ª Tessalonicenses 2:11-12; 1.ª Pedro 2:8). Mas todos os que perecem, só jogarão a culpa em si mesmos; enquanto que os que alcançam o céu, darão graças a Deus.

Se temos de ser ensinados pela Escritura, devemos crer que todo homem é responsável conforme a sua luz. O gentio é responsável de ouvir a voz da Criação. O judeu é responsável sobre a base da lei. A cristandade é responsável sobre a base de uma revelação completa que se acha contida em toda a Palavra de Deus. Se Deus manda a todos os homens em todo lugar, que se arrependam, quer dizer o que afirma, ou simplesmente se refere a todos os escolhidos? Quê direito temos de adicionar, alterar, recortar ou acomodar a Palavra de Deus? Nenhum!

Tomemos a Escritura tal como está, e recusemos tudo o que não possa resistir a prova. Bem podemos por em dúvida a solidez de um sistema que não é capaz de suportar toda a força da Palavra de Deus em seu conjunto. Se as passagens da Escritura parecem contraditórias, só nos parecem por causa de nossa ignorância. Reconheçamos humildemente isto, e esperemos em Deus para uma luz maior. Isto, bem podemos estar seguros disso, é o firme terreno moral que devemos ocupar. Ao invés de tratar de reconciliar aparentes discrepâncias, inclinemo-nos aos pés do Mestre e justifiquemo-nos em todos os seus ditos. Assim colheremos abundantes frutos de bênçãos, e cresceremos no conhecimento de Deus e de sua Palavra em conjunto.

Uns poucos dias atrás, um amigo pôs em nossas mãos um sermão que havia sido pregado recentemente por um eminente clérigo pertencente à alta escola de doutrina. Temos achado neste sermão, igual à carta de nosso correspondente, os efeitos de uma teologia torcida que mostra um só lado da verdade. Por exemplo, ao se referir a essa magnífica declaração de João o Batista, em João 1:29, o pregador a cita da seguinte maneira: «Eis aqui o Cordeiro de Deus, que tira o pecado de todo o mundo do eleito povo de Deus.»

Mas na passagem não diz nenhuma só palavra acerca do «eleito povo de Deus». Refere-se à grande obra propiciatória de Cristo, em virtude da qual toda traça de pecado será apagada de toda a criação de Deus. Nós veremos a plena aplicação desse bendito texto da Escritura somente no novo céus e na nova terra, nos quais mora a justiça. Limitar a passagem ao pecado dos escolhidos de Deus, só pode ser considerado como fruto do prejuízo teológico, que torce a verdade.


NOTAS

[1] N. do T.— Na cristandade há dois sistemas teológicos ,duas escolas de pensamento, antagônicos, cujos nomes devem sua origem àqueles que formularam pela primeira vez suas idéias: Arminianismo (de Armínio, teólogo protestante holandês) e calvinismo (de João Calvino, reformador francês). Cada um cita um grupo de textos bíblicos com o fim de sustentar sua postura. O arminianismo, baseado em um grupo de passagens, afirma que o homem é responsável de crer, mas deduz dessa responsabilidade uma capacidade própria dentro do homem para ir a Cristo, definindo que o homem tem a faculdade de auto determinação (o que na filosofia se denomina «livre arbítrio»). Enquanto que a escola contrária —o calvinismo— se apóia em outra série de textos para fazer basear tudo na soberania de Deus, o qual é certo, mas seu erro consiste na eliminação total da responsabilidade do homem. Estendendo suas deduções lógicas, o calvinismo cria assim uma teoria de «reprovação dos incrédulos pelo decreto eterno de Deus», e não pela própria responsabilidade dos que se perdem. Se pode ler pelo mesmo autor o artigo «La responsabilidad moral del hombre ante Dios y su falta de poder», que é muito útil para esclarecer tão importante e solene assunto da responsabilidade do homem e de sua total incapacidade.

[2] N. do A.— É muito interessante notar a maneira em que a Escritura nos previne contra a repulsiva doutrina da reprovação. Vejamos, por exemplo, Mateus 25:34. Aqui, o Rei, ao se dirigir aos de sua direita, lhes diz: “Vinde, benditos de meu Pai, herdai o reino preparado para vós desde a fundação do mundo.” Em contraste com isto, ao se dirigir aos da esquerda, lhes diz: “Apartai-vos de mim, malditos [notemos que não diz ‘de meu Pai’], ao fogo eterno preparado [não para vós, senão] para o diabo e seus anjos.” O mesmo podemos apreciar no capítulo 9 da epístola aos Romanos. Ao Falar dos “vasos de ira” (v. 22), diz: “preparados para destruição”, não preparados por Deus seguramente, senão por si mesmos. Mas quando menciona os “vasos de misericórdia”, diz: “que ele preparou de antemão para glória” (v. 23). A grande verdade da eleição é plenamente estabelecida; mas o repulsivo erro da reprovação é cuidadosamente evitado.

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Irmãos em Cristo Jesus.

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