sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Escritura Sacada - Wilson Franklim

“Instrua a criança segundo os objetivos que você tem para ela, e mesmo com o passar dos anos não se desviará deles” Pv (22.6).

O versículo acima é a tradução de Pv 22.6 da Bíblia NVI (Nova Versão Internacional) não é uma tradução literal, e isso é afirmado pela própria editora: “A NVI define-se como tradução evangélica, fiel e contemporânea. Não se trata de tradução literal do texto bíblico, muito menos de mera paráfrase” (grifos meus).
O ponto gerador desse artigo é uma leitura crítica, uma elementar sistematização em torno da tradução interpretativa da NVI de Pv 22.6. Analisar-se-á rapidamente a tradução literal
desse versículo em seu contexto imediato e depois se fará a comparação com a tradução interpretativa realizada pela NVI.

I. As Diversas Versões da Bíblia São Iguais?
Há atualmente várias versões da Bíblia em português. Entretanto, diante dessas versões surgem algumas perguntas: 1. Qual versão é a verdadeira e pura Palavra de Deus? 2. Todas as versões são iguais? Há quem inadvertidamente diga que todas as versões são iguais. O fato problemático dessa afirmativa é que basta se fazer uma leitura superficial nas mais variadas versões e, se constatará, facilmente, que as versões não são iguais. Há grandes diferenças.
Um exemplo claro está no versículo de Pv 22.6 acima. Um versículo amado e muito recitado em nossas igrejas. Um versículo que já faz parte da memória histórica da cristandade mundial dado sua importância na criação das crianças segundo os preceitos do Eterno. Então se volta à pergunta inicial: Qual versão, ou quais versões da Bíblia em português pode se confiar como uma tradução mais precisa da Palavra de Deus e, portanto fiel aos idiomas originais?
Com este indicativo, fica claro que as diversas versões da Bíblia não são iguais. Algumas chegam mesmo a alterar o significado correto da Palavra de Deus. Isto torna o tema demasiado importante porque todos os aspectos da vida do salvo estão alicerçados nas Escrituras Sagradas (Sl 119.105).

II. Um Convite à Reflexão
Nesse artigo quero introduzir um convite à reflexão a todo leitor e estudioso da Bíblia para algo que pode ser um problema: o uso das versões interpretativas da Bíblia Sagrada como sendo Palavra de Deus, isto é como sendo Bíblia. Não se contesta que toda versão contém certa “dose” de interpretação. Nessa perspectiva a melhor versão é a que tem o menor nível de interpretação. Observe.
Se por um lado, o ponto ideal, na relação entre os textos nos idiomas originais e as suas respectivas traduções em português (AT e NT), certamente seria que a tradução fosse uma cópia fiel (na língua portuguesa) dos originais (hebraico e grego). Mas essa realidade é muito difícil de ser atingida. Atrevo-me a dizer que sem o auxílio do Espírito Santo é mesmo impossível.
Por outro lado, existem aquelas versões da Bíblia que vão muito além de apenas traduzir. São interpretativas em função do(s) método(s) de tradução que se utilizaram. Uma tradução interpretativa é a interpretação de seus tradutores. , que por mais brilhantes que sejam, são seres humanos que acertam, mas também erram. Outra questão não menos importante que se levanta é: Será que o Eterno permite alguém re-escrever sua Palavra? Deixo para o leitor essa resposta.
Quando falo em Palavra de Deus refiro-me à Bíblia Sagrada, aos 66 livros que compreendem o Antigo e o Novo Testamento e que foram providencialmente preservados por Deus em seus idiomas originais no decorrer da história humana.
Penso que os estudiosos, educadores, pastores e teólogos que reconhecem a Bíblia como verdadeira Palavra de Deus temos uma responsabilidade: orientar ao povo Deus sobre o cuidado que se deve ter ao escolher uma versão da Bíblia.

III. Uma Breve Análise Exegética-Hermenêutica de Pv 22.6
Por questões de fontes, usarei o texto hebraico transliterado com referencias de Strong: Chanak {khaw-nak'}(2596) (Educa, instrui); na`ar {nah'-ar} (5288) (o menino); peh {peh} (6310) (com a boca); derek {deh'-rek} (1870) (a maneira de viver, ou o caminho que deve andar) (1571) (até mesmo); )zaqen {zaw-kane'} (2204) (quando fique velho); (3808) (não); cuwr {soor} or suwr {soor} (5493) (desviará dele).
Essa tradução é fidelíssima. Nessa perspectiva, as tradicionais Bíblias Almeidas, traduziram corretamente este versículo: “Educa o menino no caminho em que deve andar, e até quando envelhecer não se desviará dele” (Pv 22.6) (IBB); ou “educa a criança no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará dele” (Pv 22.6) (SBTB).Vale aqui citar que a NVI reconhece que essa tradução literal é correta, pois, em letras menores, em sua nota de rodapé “c” afirma: “ou no caminho que deve seguir, e mesmo quando envelhecer” (NVI p.518).
Analisando o contexto imediato de Pv 22.6, pode-se constatar que a tradução literal adotada pelas tradicionais Bíblias Almeidas está correta. Isto pode ser demonstrado pela forte ênfase que autor de Provérbios dá ao tema: O temor do Senhor, o caminho a ser ensinado a criança.
Observe que no versículo 4 desse capítulo (22) tem-se: “o galardão da humildade e do temor do Senhor é riqueza, e honra e vida” (Pv 22.4). Considerando que o temor do Senhor aparece treze vezes no livro de Provérbios (1.29; 2.5; 8.13; 9.10; 10,27; 14.26-27; 15.16,33; 16.6; 19.23; 22,4; 23.17); e que o temor do Senhor é tema principal do livro, pois o escritor sagrado chega mesmo a afirmar que tem no temor a Deus o princípio (hebraico resit) do conhecimento, mais ainda, o primeiro princípio (hebraico te hilâh) da sabedoria (Pv 9.10). Conclui-se que quando os homens temiam ao Senhor andavam em retidão (Pv 14.2), longe da perversidade (Pv 16.17) e evitavam e detestavam o mal (Sl 34.11; Jó 1.1; Pv 3.7; 16.6).
Portanto quando o escritor sagrado ordena: “instrui a criança no caminho em que deve andar... (Pv 22.6), qual caminho ele está indicando? O caminho humano, ou caminho de Deus? O caminho do temor do Senhor (Pv 22.4).De fato, o ensino ao qual se refere Pv 22.6 é o temor do Senhor, o conhecimento que vem de Deus, da sua santa Palavra. É um conhecimento que não é gerado pelo homem, mas pelo Eterno Deus Yahweh. “Porque o Senhor dá a sabedoria; da sua boca procedem o conhecimento e o entendimento (Pv 2.6). Assim pode-se afirmar que Pv 22.6 é um mandamento para os pais ensinarem o caminho de Deus às crianças.

IV Uma Breve Observação da Tradução NVI de Pv 22.6
Acredito que os tradutores da NVI traduziram Pv 22.6 “Instrua a criança segundo os objetivos que você tem para ela, e mesmo com o passar dos anos não se desviará deles”, porque na tentativa de evitarem uma tradução literal, não priorizaram o contexto imediato no qual está inserido o versículo e muito menos o contexto de todo do Livro de Provérbios.
No entanto os tradutores da NVI, de certa forma, reconhecem o valor e a precisão da tradução literal quando a citam em sua nota de rodapé c (p.518), mas assumem uma tradução alternativa cuja ênfase ideológica se foca no ser humano em detrimento de Deus. Nessa perspectiva fica ruim o slogam da NVI “Bíblia do século XXI” porque nos induz a pensar que a NVI se amolda ao humanismo, à ideologia do século XXI, cuja filosofia dominante é aquela em que o homem ocupa o centro do universo, e Deus é relativizado...
J. M. Boice corretamente afirmou que a nossa geração é centralizada no homem e infelizmente a igreja, e as organizações para-eclesiásticas traiçoeiramente, têm se tornado egocêntricas (por ex. a melhor igreja, o melhor pastor, a melhor versão...). Essa realidade está muito presente na cosmovisão das igrejas modernas, seja através dos cultos, orações, cânticos, do tipo de mensagem pregada, e agora parece fincar bandeira em algumas versões da Bíblia.

Conclusão
Esse assunto da grande diversidade de versões modernas da Bíblia é algo a ser refletido com o devido cuidado. Isto porque as verdades da fé são de tal forma conexas que uma afirmação, ou mesmo uma nova versão da Bíblia, somente se mantém se estiver em coerência com as bases do edifício teológico do verdadeiro Cristianismo.
Conforme foi traduzido Pv 22.6 pela NVI, se recitado fora de seu contexto, faz parecer ao leitor que a educação da criança é um ato exclusivo dos objetivos humanos (de seu educador). Levando para o lado dos não salvos isso pode até ser devastador. Imaginem quais objetivos têm para seus filhos, aqueles pais cujas atividades e práxis de vida contrariam frontalmente a Palavra de Deus. Certamente que esses objetivos não incluem o temor ao Senhor.
Reconhecimento: Registro meu reconhecimento à Imprensa Bíblica Brasileira, e a Convenção Batista Brasileira que bravamente resistiram à onda das traduções “modernas”, interpretativas e paráfrases da Palavra de Deus. Nessa perspectiva a Imprensa Bíblica Brasileira e também a Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil foram às únicas Imprensas Bíblicas no Brasil que não editaram traduções interpretativas, denominando-as de Bíblia Sagrada. Isso demonstra respeito e reverência ao Santíssimo Deus Yahweh e à sua Sagrada Escritura, isto é o temor ao Senhor.


(*) O Autor é Pastor Igreja Batista em Vila Jaguaribe - RJ, Pós-graduado em NT, Mestre em Teologia Sistemática, Doutorando em Teologia. fator10@gmail.com
Todas as citações bíblicas são da ACF (Almeida Corrigida Fiel, da SBTB). As ACF e ARC (ARC idealmente até 1894, no máximo até a edição IBB-1948, não a SBB-1995) são as únicas Bíblias impressas que o crente deve usar, pois são boas herdeiras da Bíblia da Reforma (Almeida 1681/1753), fielmente traduzida somente da Palavra de Deus infalivelmente preservada (e finalmente impressa, na Reforma, como o Textus Receptus).
(retorne a http://solascriptura-tt.org/ Bibliologia-Traducoes/ retorne a http:// solascriptura-tt.org/ )

[1] Palavras da Comissão de tradução NVI Em http://www.editoravida.com.br/biblias_nvi/nvi_biblia_seculo21.asp
[2] Por tradução literal entenda-se a tradução realizada pelo método de equivalência formal literal, que tem como alvo principal ser como uma cópia o mais fiel possível aos textos do idioma fonte.
[3] Por exemplo: Uma paráfrase da Bíblia é uma interpretação de um ou mais autores, neste sentido deveria se chamar “interpretação, ou paráfrase da Bíblia segundo fulano de tal” e jamais Bíblia Sagrada, ou pior Bíblia na linguagem de hoje.
[4] GREEN, J.P. The Interlinear Bible – Hebrew-Greek-English. Massachusetts, Hendrickson, 1986. p.523.
[5] BIBLEWORKS 7.0 CD Digital
[6] IBB – Imprensa Bíblica Brasileira (Versão Revisada)
[7] SBTB – Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil ( ACF- Almeida Corrigida Fiel)
[8] KIDNER, D. Provérbios Introdução e Comentário. São Paulo, Mundo Cristão, 1992. p.57
[9] KAISER Jr, W. C. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo, Vida Nova, 1988. p.174
[10] BENTES, J.M. e CHAMPLIM, R.N. Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia. São Paulo, Candeia, 1991. Vol I p.963.
[11] Destaco o meu respeito ao o grupo de tradutores da NVI, até onde vai meu conhecimento, são pessoas de reconhecido valor acadêmico. Minha crítica a NVI é estritamente a sua ideologia de ser muito mais uma versão interpretatitiva que uma tradução.
[12] BOICE, J. M. "Whatever Happened to God?" in Modern Reformation, 1996. p.13.

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